terça-feira, 8 de outubro de 2013

Para viver em paz, perdoar é preciso

Saber perdoar a si mesmo e a quem nos fez mal pode não ser fácil. Mas é um ato necessário para se libertar de rancores, evitar doenças e tocar a vida adiante.



Você pode começar enchendo os bolsos de pedras. Depois, pode colocar outras dentro de roupas íntimas e no interior de um chapéu ou boné. Por fim, recheie de pedregulhos uma mochila grande, que será carregada nas costas até o fim do dia. Para muitos essa sensação será equivalente ao peso trazido na alma pelas mágoas acumuladas ao longo da vida.

Mágoas que poderiam ser dispensadas, como as tais pedras, com o difícil – mas necessário – exercício do perdão. O desenvolvimento de vários problemas psíquicos (como depressão) e físicos (como doenças autoimunes) estaria ligado a esse acúmulo de ressentimentos, diz a psicóloga e terapeuta familiar sistêmica Daniela Bertoncello. “Recordo-me de uma cliente que se deprimiu por conta de uma rejeição dos pais na infância. Na vida adulta, quando ela se tornou mãe e teve de lidar com seu papel materno, veio à tona todo o conflito, um quadro da depressão e a necessidade de perdoar seus pais”, conta.



Para o auxiliar jurídico Maurício Filoco de nada vale pedir perdão se não há uma mudança de comportamento.


De bem com a consciência

Tão importante quanto perdoar é tomar a iniciativa de pedir perdão, algo que muitos não fazem por uma questão de orgulho. “Eu perdoo, mas confesso que tenho dificuldades de pedir perdão. Talvez seja receio de mostrar a minha fraqueza diante do outro”, reconhece o segurança de lojas Almir Cunha.

Diferente de Almir, o auxiliar jurídico Maurício Filoco garante que não pensa duas vezes em pedir perdão quando percebe que errou. Depois de fazer a ex-mulher sofrer com uma traição, ele também penou com o peso da culpa. “Foi duro, porque eu larguei a mulher com quem estava casado para ficar com outra que teve um filho meu. Foi um ato impulsivo e, no fim, percebi que eu amava realmente a minha primeira mulher. Só que ela acabou casando novamente e eu fiquei solteiro”, conta.

A tristeza diminuiu um pouco quando ele conseguiu pedir perdão à ex-mulher. “Ela não quis voltar comigo, mas aceitou o perdão. Isso me fez bem, me deixou mais leve, e espero que a tenha deixado mais leve também.” Filoco tem consciência de que de nada vale pedir perdão se não há uma mudança de comportamento. “Se você continua aprontando, o pedido não tem valor. Eu mesmo aprendi a lição, e serei fiel quando encontrar uma nova mulher.”


Na prática

Autor do livro O Poder do Perdão, o americano Fred Luskin, doutor em aconselhamento clínico e psicologia da saúde pela Universidade de Stanford, indica alguns passos para conseguir perdoar:

- Saiba exatamente como você se sente sobre o que aconteceu e seja capaz de expressar o que há de errado na situação. Compartilhe essa experiência com algumas pessoas de confiança.

- Não espere pedidos de desculpa dos outros nem da vida. Faça o que for preciso para se sentir melhor. O ato de perdoar é para você e para ninguém mais.

- Perdoar não significa necessariamente reconciliar-se com a pessoa que o feriu, nem tornar-se cúmplice dela. O que você deve buscar é a sua paz. O perdão é um poder pessoal.

- Lembre-se de que uma vida bem vivida é o seu melhor troco. Em vez de concentrar-se nas suas mágoas – o que daria poder à pessoa que o magoou –, concentre suas energias na busca do amor e da bondade ao seu redor.

- Modifique a sua história de ressentimento, de modo que ela o lembre de que perdoar é uma escolha heroica.


Pessoas amarguradas também têm problemas recorrentes de relacionamento, ressalta a psicoterapeuta Eneida Ludgero da Silva: “Se não perdoamos, ficamos presos ao momento do dano, perda ou rejeição, e com isso abrimos mão de viver plenamente. O perdão é uma ponte que usamos para prosseguir caminhando, quando a estrada, por qualquer motivo, foi interrompida”. Para ela, é comum ouvir dessas pessoas expressões como “os homens (ou mulheres) são todos iguais”, o que expressa um sentimento de desconfiança generalizada, como se uma experiência ruim estivesse sempre prestes a se repetir.

A psicóloga e consultora organizacional Ana Borgo acrescenta, ainda, que o poder do perdão foi comprovado cientificamente pelo psicólogo americano Fred Luskin, da Universidade de Stanford, que escreveu um livro sobre o assunto e comprovou, por meio de pesquisas, que o rancor desencadeia uma série de doenças, inclusive câncer.

Você consegue

Diante de todos os males que o rancor pode causar, uma dúvida permanece: por que é tão difícil perdoar a si mesmo e aos outros? Por que é tão duro seguir o célebre exemplo do papa João Paulo II (1920-2005), que perdoou pessoalmente o homem que atirou contra ele?

Para Ana Borgo, muitos confundem o perdão com a aceitação de uma injustiça, o que seria abominável. “Mas perdoar não é ser condescendente. Não é, por exemplo, deixar livre um bandido, que precisa se responsabilizar por seus atos. Perdoar é se libertar do sentimento de mágoa que está o prendendo.”

A cozinheira Valdirene An­­drade é daquelas que ainda não consegue perdoar naturalmente. “Eu me considero ainda muito teimosa para perdoar, e não consigo nem ficar perto da pessoa que me faz mal. Espero um dia ter esse poder.”

Como modelo, Valdirene tem a amiga Ivanilde Silva, também cozinheira. Ivanilde não só perdoou uma colega que provocou sua demissão, como conseguiu para ela um emprego, quando essa colega ficou desempregada. “Se vejo que alguém me faz mal por ciúmes ou falta de capacidade, a única coisa que sinto é pena. Quando essa colega me prejudicou, fui à igreja e pedi misericórdia para ela. Logo em seguida eu estava empregada e até pude ajudá-la. É claro que não tenho mais a mesma confiança nela, mas a perdoei e não a quero mal.”

Segundo Ivanilde, essa prática foi aprendida sobretudo com a vida. “Perdi meus pais muito cedo e vi que não me fazia bem carregar mágoas. O perdão nos deixa mais leves”, diz ela.

Qual o seu limite?

Ivanilde afirma que sua capacidade de perdoar é grande, mas reconhece que teria dificuldade em desculpar alguém que tivesse feito mal a seus filhos e netos. Frente a situações extremas, a psicóloga Daniela reconhece que, pela própria condição de imperfeição do ser humano, nem tudo pode ser perdoado. Porém, sempre há quem consiga, sozinho ou com a ajuda de terapias, superar dores impensáveis. “Já tive uma paciente que conseguiu perdoar o próprio pai, de quem sofreu abuso se­­­xual na infância juntamente com suas irmãs, a partir do momento em que aceitou cuidar dele quando adoeceu e faleceu em sua casa. Ela viu seu pai sofrer tanto, que o perdoou, como se a vida mesmo tivesse trazido a punição que merecia.”

Adepta da Seicho-no-ie, filosofia religiosa de origem japonesa, Cleuza de Jesus Zanatta, também conseguiu perdoar o pai, por quem sentiu ódio por muito tempo. “Ele era alcoólatra, e eu tinha uma mágoa dentro de mim muito grande, por todas as coisas que ele fazia que prejudicavam a minha vida.” O perdão para ela só foi possível por meio de exercícios incentivados pela Seicho-no-ie. “Temos inclusive uma oração só para o perdão, que faz você entender melhor o outro e ver as suas qualidades.”

A atitude de perdoá-lo também surgiu mesmo sem ele ter pedido desculpas. “Meu pai nem imaginava que eu tinha ódio dele. Mas a partir do momento em que uma das partes toma a inciativa e se propõe a perdoar é impressionante como o comportamento do outro muda, graças ao amor de Deus. Hoje fico contente de ter feito as pazes enquanto ele estava vivo.”

Perdoe a si mesmo

Assessora e integrante da Federação Espírita do Paraná, Maria Helena Marcon destaca que tão difícil quanto perdoar os outros é conseguir perdoar a si próprio. “O sentimento de culpa é um dos grandes responsáveis por nossas infelicidades. E isso tem a ver com o orgulho. Não podemos admitir, nem para nós mesmos, que fomos capazes de cometer falhas e ficamos nos punindo, o que pode provocar várias enfermidades.” Segundo ela, o mais sensato é que cada um reconheça que todos somos aprendizes da vida e, portanto, com o direito de errar.

“Imagine se o apóstolo Saulo de Tarso não tivesse se permitido o autoperdão e tivesse ficado a se lamentar pelos equívocos que cometera, desencadeando perseguições aos primeiros seguidores de Jesus. Tivesse ele ficado a pensar indefinidamente nas falhas que cometera e não teríamos o grande Paulo de Tarso, com seu trabalho grandioso de divulgação cristã e o legado extraordinário das suas epístolas.”

Todo dia é dia de perdoar

Em muitas religiões o perdão é um exercício primordial. No judaísmo, por exemplo, essa prática é tão importante que existe até um dia consagrado especialmente a isso: o Yom Kippur, celebrado esse ano no dia 26 de setembro. “Nesse dia, Deus perdoa as transgressões que fizemos, mas não de modo automático. Durante 30 dias antes a pessoa passa por um processo de introspecção, examinando seus erros, até que no dia do Yom Kippur você vai até a pessoa e pede perdão”, explica o rabino Pablo Berman, da comunidade israelita do Paraná.

No judaísmo, nem todos os pecados são perdoados - como o praticado por quem comete um assassinato, por exemplo -, mas muitos outros são. O rabino também acrescenta que o exercício de perdoar e pedir perdão pode e deve ser praticado diariamente, não só no Yom Kippur. “Lendo os livros sagrados, você percebe que, desde a criação do mundo, o que mais acontece são brigas entre irmãos e famílias, conflitos que poderiam ser evitados através do perdão. Todas as brigas, inclusive entre países e religiões, como o judaísmo e o islamismo, poderiam ser resolvidas assim.”

Perdão católico


Se para os judeus o pedido de perdão a Deus é feito diretamente a ele, em orações públicas ou particulares, na religião católica o perdão pode ser pedido através das confissões, lembra o arcebispo metropolitano de Curitiba Dom Moacyr José Vitti. “Um dos presentes mais preciosos dados por Jesus foi quando ele, após a ressureição, apareceu a seus discípulos e disse: quem perdoar os pecados será perdoado; quem não perdoar não será perdoado. Jesus sempre transformou a vida dos pecadores através da sua misericórdia, e a Igreja, que recebeu esse poder, continua essa missão através dos seus sacerdotes”.





Você pode começar enchendo os bolsos de pedras. Depois, pode colocar outras dentro de roupas íntimas e no interior de um chapéu ou boné. Por fim, recheie de pedregulhos uma mochila grande, que será carregada nas costas até o fim do dia. Para muitos essa sensação será equivalente ao peso trazido na alma pelas mágoas acumuladas ao longo da vida.

Mágoas que poderiam ser dispensadas, como as tais pedras, com o difícil – mas necessário – exercício do perdão. O desenvolvimento de vários problemas psíquicos (como depressão) e físicos (como doenças autoimunes) estaria ligado a esse acúmulo de ressentimentos, diz a psicóloga e terapeuta familiar sistêmica Daniela Bertoncello. “Recordo-me de uma cliente que se deprimiu por conta de uma rejeição dos pais na infância. Na vida adulta, quando ela se tornou mãe e teve de lidar com seu papel materno, veio à tona todo o conflito, um quadro da depressão e a necessidade de perdoar seus pais”, conta.



De bem com a consciência

Tão importante quanto perdoar é tomar a iniciativa de pedir perdão, algo que muitos não fazem por uma questão de orgulho. “Eu perdoo, mas confesso que tenho dificuldades de pedir perdão. Talvez seja receio de mostrar a minha fraqueza diante do outro”, reconhece o segurança de lojas Almir Cunha.

Diferente de Almir, o auxiliar jurídico Maurício Filoco garante que não pensa duas vezes em pedir perdão quando percebe que errou. Depois de fazer a ex-mulher sofrer com uma traição, ele também penou com o peso da culpa. “Foi duro, porque eu larguei a mulher com quem estava casado para ficar com outra que teve um filho meu. Foi um ato impulsivo e, no fim, percebi que eu amava realmente a minha primeira mulher. Só que ela acabou casando novamente e eu fiquei solteiro”, conta.

A tristeza diminuiu um pouco quando ele conseguiu pedir perdão à ex-mulher. “Ela não quis voltar comigo, mas aceitou o perdão. Isso me fez bem, me deixou mais leve, e espero que a tenha deixado mais leve também.” Filoco tem consciência de que de nada vale pedir perdão se não há uma mudança de comportamento. “Se você continua aprontando, o pedido não tem valor. Eu mesmo aprendi a lição, e serei fiel quando encontrar uma nova mulher.”

Na prática

Autor do livro O Poder do Perdão, o americano Fred Luskin, doutor em aconselhamento clínico e psicologia da saúde pela Universidade de Stanford, indica alguns passos para conseguir perdoar:

- Saiba exatamente como você se sente sobre o que aconteceu e seja capaz de expressar o que há de errado na situação. Compartilhe essa experiência com algumas pessoas de confiança.

- Não espere pedidos de desculpa dos outros nem da vida. Faça o que for preciso para se sentir melhor. O ato de perdoar é para você e para ninguém mais.

- Perdoar não significa necessariamente reconciliar-se com a pessoa que o feriu, nem tornar-se cúmplice dela. O que você deve buscar é a sua paz. O perdão é um poder pessoal.

- Lembre-se de que uma vida bem vivida é o seu melhor troco. Em vez de concentrar-se nas suas mágoas – o que daria poder à pessoa que o magoou –, concentre suas energias na busca do amor e da bondade ao seu redor.

- Modifique a sua história de ressentimento, de modo que ela o lembre de que perdoar é uma escolha heroica.


Pessoas amarguradas também têm problemas recorrentes de relacionamento, ressalta a psicoterapeuta Eneida Ludgero da Silva: “Se não perdoamos, ficamos presos ao momento do dano, perda ou rejeição, e com isso abrimos mão de viver plenamente. O perdão é uma ponte que usamos para prosseguir caminhando, quando a estrada, por qualquer motivo, foi interrompida”. Para ela, é comum ouvir dessas pessoas expressões como “os homens (ou mulheres) são todos iguais”, o que expressa um sentimento de desconfiança generalizada, como se uma experiência ruim estivesse sempre prestes a se repetir.

A psicóloga e consultora organizacional Ana Borgo acrescenta, ainda, que o poder do perdão foi comprovado cientificamente pelo psicólogo americano Fred Luskin, da Universidade de Stanford, que escreveu um livro sobre o assunto e comprovou, por meio de pesquisas, que o rancor desencadeia uma série de doenças, inclusive câncer.

Você consegue


Diante de todos os males que o rancor pode causar, uma dúvida permanece: por que é tão difícil perdoar a si mesmo e aos outros? Por que é tão duro seguir o célebre exemplo do papa João Paulo II (1920-2005), que perdoou pessoalmente o homem que atirou contra ele?

Para Ana Borgo, muitos confundem o perdão com a aceitação de uma injustiça, o que seria abominável. “Mas perdoar não é ser condescendente. Não é, por exemplo, deixar livre um bandido, que precisa se responsabilizar por seus atos. Perdoar é se libertar do sentimento de mágoa que está o prendendo.”

A cozinheira Valdirene An­­drade é daquelas que ainda não consegue perdoar naturalmente. “Eu me considero ainda muito teimosa para perdoar, e não consigo nem ficar perto da pessoa que me faz mal. Espero um dia ter esse poder.”

Como modelo, Valdirene tem a amiga Ivanilde Silva, também cozinheira. Ivanilde não só perdoou uma colega que provocou sua demissão, como conseguiu para ela um emprego, quando essa colega ficou desempregada. “Se vejo que alguém me faz mal por ciúmes ou falta de capacidade, a única coisa que sinto é pena. Quando essa colega me prejudicou, fui à igreja e pedi misericórdia para ela. Logo em seguida eu estava empregada e até pude ajudá-la. É claro que não tenho mais a mesma confiança nela, mas a perdoei e não a quero mal.”

Segundo Ivanilde, essa prática foi aprendida sobretudo com a vida. “Perdi meus pais muito cedo e vi que não me fazia bem carregar mágoas. O perdão nos deixa mais leves”, diz ela.

Qual o seu limite?

Ivanilde afirma que sua capacidade de perdoar é grande, mas reconhece que teria dificuldade em desculpar alguém que tivesse feito mal a seus filhos e netos. Frente a situações extremas, a psicóloga Daniela reconhece que, pela própria condição de imperfeição do ser humano, nem tudo pode ser perdoado. Porém, sempre há quem consiga, sozinho ou com a ajuda de terapias, superar dores impensáveis. “Já tive uma paciente que conseguiu perdoar o próprio pai, de quem sofreu abuso se­­­xual na infância juntamente com suas irmãs, a partir do momento em que aceitou cuidar dele quando adoeceu e faleceu em sua casa. Ela viu seu pai sofrer tanto, que o perdoou, como se a vida mesmo tivesse trazido a punição que merecia.”

Adepta da Seicho-no-ie, filosofia religiosa de origem japonesa, Cleuza de Jesus Zanatta, também conseguiu perdoar o pai, por quem sentiu ódio por muito tempo. “Ele era alcoólatra, e eu tinha uma mágoa dentro de mim muito grande, por todas as coisas que ele fazia que prejudicavam a minha vida.” O perdão para ela só foi possível por meio de exercícios incentivados pela Seicho-no-ie. “Temos inclusive uma oração só para o perdão, que faz você entender melhor o outro e ver as suas qualidades.”

A atitude de perdoá-lo também surgiu mesmo sem ele ter pedido desculpas. “Meu pai nem imaginava que eu tinha ódio dele. Mas a partir do momento em que uma das partes toma a inciativa e se propõe a perdoar é impressionante como o comportamento do outro muda, graças ao amor de Deus. Hoje fico contente de ter feito as pazes enquanto ele estava vivo.”

Perdoe a si mesmo

Assessora e integrante da Federação Espírita do Paraná, Maria Helena Marcon destaca que tão difícil quanto perdoar os outros é conseguir perdoar a si próprio. “O sentimento de culpa é um dos grandes responsáveis por nossas infelicidades. E isso tem a ver com o orgulho. Não podemos admitir, nem para nós mesmos, que fomos capazes de cometer falhas e ficamos nos punindo, o que pode provocar várias enfermidades.” Segundo ela, o mais sensato é que cada um reconheça que todos somos aprendizes da vida e, portanto, com o direito de errar.

“Imagine se o apóstolo Saulo de Tarso não tivesse se permitido o autoperdão e tivesse ficado a se lamentar pelos equívocos que cometera, desencadeando perseguições aos primeiros seguidores de Jesus. Tivesse ele ficado a pensar indefinidamente nas falhas que cometera e não teríamos o grande Paulo de Tarso, com seu trabalho grandioso de divulgação cristã e o legado extraordinário das suas epístolas.”

Todo dia é dia de perdoar

Em muitas religiões o perdão é um exercício primordial. No judaísmo, por exemplo, essa prática é tão importante que existe até um dia consagrado especialmente a isso: o Yom Kippur, celebrado esse ano no dia 26 de setembro. “Nesse dia, Deus perdoa as transgressões que fizemos, mas não de modo automático. Durante 30 dias antes a pessoa passa por um processo de introspecção, examinando seus erros, até que no dia do Yom Kippur você vai até a pessoa e pede perdão”, explica o rabino Pablo Berman, da comunidade israelita do Paraná.

No judaísmo, nem todos os pecados são perdoados - como o praticado por quem comete um assassinato, por exemplo -, mas muitos outros são. O rabino também acrescenta que o exercício de perdoar e pedir perdão pode e deve ser praticado diariamente, não só no Yom Kippur. “Lendo os livros sagrados, você percebe que, desde a criação do mundo, o que mais acontece são brigas entre irmãos e famílias, conflitos que poderiam ser evitados através do perdão. Todas as brigas, inclusive entre países e religiões, como o judaísmo e o islamismo, poderiam ser resolvidas assim.”

Perdão católico

Se para os judeus o pedido de perdão a Deus é feito diretamente a ele, em orações públicas ou particulares, na religião católica o perdão pode ser pedido através das confissões, lembra o arcebispo metropolitano de Curitiba Dom Moacyr José Vitti. “Um dos presentes mais preciosos dados por Jesus foi quando ele, após a ressureição, apareceu a seus discípulos e disse: quem perdoar os pecados será perdoado; quem não perdoar não será perdoado. Jesus sempre transformou a vida dos pecadores através da sua misericórdia, e a Igreja, que recebeu esse poder, continua essa missão através dos seus sacerdotes”.


Coordenador do curso de Teologia da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Cézar Kuzma lembra ainda que o pedido de perdão é muito mencionado por católicos, porém muitas vezes sem o maior compremetimento. “Ao rezar o Pai Nosso muitos dizem: ‘perdoai as nossas ofensas’, mas não percebem o compromisso que assumem ao dizer na sequência: ‘assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendido’.”
fonte:http://www.gazetadopovo.com.br/

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